Rescisão contratual de imóvel com Alienação Fiduciária

Rescisão contratual de imóvel com Alienação Fiduciária

Sabe-se que uma das formas mais utilizadas para aquisição de imóvel no Brasil, hoje em dia, é por intermédio do instituto do financiamento imobiliário com Alienação Fiduciária, regulado pela Lei 9.514/1997, que consiste no empréstimo provido pelos bancos e outras instituições do Sistema de Financiamento Imobiliário ao comprador, do valor necessário para compra do imóvel, que pertence juridicamente ao fiduciário (banco) enquanto a dívida e seus encargos não forem quitados pelo fiduciante (cliente).  

Entretanto, por diversas vezes, o cliente se torna incapaz de arcar com as parcelas mensais, e, para não perder o valor despendido, busca a possibilidade de rescindir o contrato de compra e venda e a conseguinte devolução dos valores pagos junto à vendedora do imóvel (incorporadora). Porém, existe a figura de um terceiro na relação fiduciária, o banco, tornando a rescisão complexa.   

Nesse caso, portanto, não seria possível a rescisão com devolução dos valores pagos, em razão da multiplicidade de contratos acessórios firmados junto ao contrato principal de compra e venda, vez que há o contrato de empréstimo (mútuo), além da cláusula de garantia dada como o próprio imóvel. Dessa forma, este fica registrado em propriedade do banco, e não do cliente, estando tal situação consolidada, ainda, por escritura definitiva, impossibilitando o retorno ao status quo ante (situação anterior) da relação jurídica, sendo os valores devolvidos e o imóvel restituído ao dono anterior.   

Nesse sentido que decidiu a juíza federal da 9ª Vara Cível Federal de São Paulo/SP, reconhecendo que há a escritura de compra e venda definitiva envolvendo a incorporadora, os compradores e a Caixa Econômica Federal (fiduciária no caso), além de contrato acessório de empréstimo (mútuo) com alienação fiduciária em garantia a favor da CEF.  

Isso porque, na hipótese de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel, o STJ sedimentou na Súmula 543 que as parcelas devem ser imediatamente devolvidas ao promitente comprador, integralmente quando por vontade do promitente vendedor e parcialmente quando a causa da resolução contratual partir do comprador. Porém, ao passo que é simples a rescisão nesse caso, no outro se faz complexa.  

Por alguns motivos: o comprador declarou sua vontade de adquirir o imóvel nessas condições e assumiu, voluntariamente, os riscos decorrentes do contrato. Ademais, o ordenamento jurídico brasileiro impõe, por força de princípio, a obrigatoriedade de respeitar o contrato firmado licitamente em decorrência da liberdade contratual, posto que as partes podem estabelecer livremente as cláusulas contratuais, nos limites da lei, de modo que devem cumprir com as obrigações assumidas.  

Assim, a alteração, bem como a firmação do contrato, deve ser bilateral, ou seja, as partes envolvidas devem concordar com os termos de alteração propostos. Por isso, o inadimplemento do cliente nesse caso, sendo, inclusive, admitido por ele, ocasiona o dever de arcar com as perdas e danos das outras partes envolvidas, e não o contrário.  

Isto é, se ele decidiu pactuar a compra do referido imóvel recebendo emprestado o valor do banco, caso desista, deve arcar com as consequências da referida desistência, e com o ônus dos valores já pagos, até porque enquanto esteve em posse do imóvel, usufruiu integralmente do bem, sendo restrito apenas ao direito de reivindicá-lo e negociá-lo.  

O fato do cliente não mais ter condição de pagar as parcelas, por mais que moralmente seja uma causa justa de rescisão contratual, juridicamente, enseja o descumprimento das obrigações que assumiu no instrumento pactuado, mais especificamente do dever de pagar as parcelas mensais referentes ao financiamento imobiliário que realizou. Isso porque a vontade de rescisão, in casu, é unilateral, sem qualquer causa dada pelo vendedor ou pelo banco.   

Pelo contrário, este cumpriu com sua obrigação na condição de mutuante, emprestando o valor requerido pelo cliente, e, assim, o próprio tem o dever de cumprir com as suas também, devolvendo a quantia emprestada na mesma espécie e quantidade, nos termos dos artigos 1.256 e 1.264 do Código Civil. Não há possibilidade, portanto, de serem devolvidas as parcelas adimplidas ao devedor, pois a obrigação do banco já se exauriu, restando pura e simplesmente as do cliente.  

Por fim, tendo o cliente admitido o inadimplemento, ele, portanto, incorre em mora, de modo que, nos termos da Lei 9.514/97, o bem se consolida em propriedade do credor fiduciário (banco), autorizando-se que ele adote as medidas cabíveis para a venda do imóvel dado em garantia, sem prejuízo de não restar obrigado a devolver os valores das parcelas já adimplidas pelo cliente, pelas razões acima expostas.  

Por isso, é indispensável que o cidadão, em que pese o desejo de adquirir casa própria, tenha consciência e avalie bastante as condições do contrato pactuado, bem como as obrigações assumidas, por exemplo, de pagar um valor mensal fixo durante 10 ou 20 anos.  

Isto é, antes de firmar um instrumento de financiamento imobiliário com alienação fiduciária, faz-se mister que ele pense e projete se terá condições de arcar com os vencimentos por tão elevado período, para que não se encerre na situação aqui exposta, correndo o risco de “perder” o imóvel ao banco e de sequer receber a devolução do importe gasto enquanto teve condições de arcar com as parcelas.  

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Álvaro França Teixeira