Após lei da igualdade salarial, governo decreta que empresas privadas divulguem remuneração dos colaboradores

Após lei da igualdade salarial, governo decreta que empresas privadas divulguem remuneração dos colaboradores

Após a regulamentação, pelo Governo Federal, da igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens (Lei nº 14.611/2023), foi publicado em 23 de novembro o Decreto[1] nº 11.795/2023 que obriga as organizações dos setores privados a divulgarem detalhes sobre os salários, bem como os critérios utilizados por cada empresa na determinação das remunerações de seus colaboradores.

Esta exigência se aplica às pessoas jurídicas de direito privado com 100 ou mais funcionários, que possuam sede, filial ou representação no território brasileiro. Conforme as diretrizes estabelecidas, as empresas deverão publicar em suas páginas na internet e redes sociais um Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios – que deverá ser disponibilizado para seus empregados, colaboradores e público em geral.

Além da divulgação nos canais digitais, o documento deve ser enviado ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por ferramenta informatizada, a qual ainda será disponibilizada pelo Ministério.

Não obstante, será editado um novo Ato pelo Ministério do Trabalho e Emprego que estabelecerá as informações que deverão constar do Relatório de Transparência, bem como o seu formato, o que equivale dizer que a divulgação e os relatórios só serão exigíveis com a implementação da ferramenta informatizada a ser criada pelo MTE.

Nesse sentido dispôs a citada portaria (MTE Nº 3.714, de 24 de novembro de 2023 que regulamenta o Decreto nº 11.795): “A publicação do Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será obrigatória após a disponibilização da aba Igualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios a ser implementada na área do empregador do Portal Emprega Brasil”.

Os relatórios deverão ser divulgados a cada seis meses, sempre em março e setembro e devem conter, no mínimo, informações sobre os cargos ou ocupações dos trabalhadores, juntamente com os valores correspondentes a todas as formas de remuneração, abrangendo salário contratual, décimo terceiro, gratificações, comissões, horas extras, adicionais, gorjetas, férias, aviso prévio trabalhado, descanso semanal remunerado e outras compensações estipuladas por normas coletivas de trabalho, a fim de averiguar a equivalência entre os critérios remuneratórios, função/experiência exercida por funcionários de gêneros diferentes.

Para preservar a confidencialidade dos funcionários, as informações devem ser apresentadas de forma anônima, em conformidade com as disposições da Lei de Proteção de Dados Pessoais.

Caso necessário, o Ministério do Trabalho poderá requerer informações adicionais das empresas, sendo responsável por disponibilizar uma plataforma digital para o envio das informações, relatórios de transparência e notificações às empresas em casos de identificação de disparidades salariais. Empresas notificadas terão um prazo de 90 dias para desenvolver um plano de ação visando promover a igualdade salarial.

Nesse aspecto, caberá ao Ministério do Trabalho e Emprego e ao Ministério das Mulheres monitorar os dados e o impacto da política pública e a avaliação dos seus resultados.

O MTE também deverá disponibilizar um canal específico para recebimento de denúncias relacionadas à discriminação salarial e de critérios remuneratórios, além de fiscalizar o envio dos relatórios e analisar as informações contidas neles.

Em caso de descumprimento do envio semestral dos relatórios, a Lei nº 14.611 de 3 de julho de 2023 prevê a aplicação de multa administrativa. cujo valor corresponderá a até 3% (três por cento) da folha de salários do empregador, limitado a 100 (cem) salários mínimos.

Nas palavras da Ministra das Mulheres Cida Gonçalves: “Mais que garantir o cumprimento da Lei, este Decreto é um passo importante para a garantia da igualdade entre mulheres e homens no mundo do trabalho. Esta é uma prioridade do governo federal, especialmente do Ministério das Mulheres. Além de ser uma questão civilizatória, os estudos já comprovam que a igualdade salarial impulsiona a economia e melhora o PIB do país”

A equipe do CFA acredita que, embora o r. decreto represente um avanço significativo na busca pela igualdade salarial, há considerações significativas com a disponibilização dos dados que deverão subsidiar o relatório, no que tange a proteção dos dados em consonância a LGPD e, os princípios constitucionais da livre concorrência e livre iniciativa.

Isso porque, no viés das diretrizes do compliance empresarial, ainda que a iniciativa tenha determinado a anonimização dos dados, é válido lembrar que nos termos do artigo 5º, I, da LGPD, se uma informação permite identificar, ainda que indiretamente um indivíduo, então ela é considerada um dado pessoal. Aqui imperioso destacar que em algumas empresas pode ocorrer de determinados cargos serem ocupados somente por 1 (um) indivíduo, assim ainda que no preenchimento do formulário seja resguardado o nome do colaborador, é certo que se apenas este indivíduo ocupe o respectivo cargo, será possível aos demais colaboradores e o público em geral identificar o titular do salário elencado.

Outrossim, ponto certamente de grande discussão futura se dará em torno dos princípios constitucionais da livre concorrência e livre iniciativa, eis que, os concorrentes, inclusive fornecedores ou tomadores de serviços, terão acesso aos custos e ao lucro das empresas a partir da compilação das despesas pessoais expostas.

De todo modo, a despeito da publicação do Decreto nº 11.795/2023, conclui-se que ainda não é possível a sua aplicação imediata, eis que o cumprimento está vinculado à regulamentação específica da ferramenta a ser criada pelo MTE.

A equipe Trabalhista e Compliance/LGPD do CFA está à disposição para esclarecer dúvidas e auxiliar na adoção de quaisquer medidas necessárias.

Confira a íntegra da normativa em:

https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-11.795-de-23-de-novembro-de-2023-525219143.

https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-mte-n-3.714-de-24-de-novembro-de-2023-525914843

 

[1] Decreto é a forma de que se revestem dos atos individuais ou gerais, emanados dos chefes do Poder Executivo (Presidente da RepúblicaGovernador e Prefeito). De modo mais amplo, o decreto pode ser definido como uma ordem proferida por uma autoridade sobre alguma matéria de sua competência. Os decretos funcionam com a intenção de complementar ou regulamentar alguma normativa jurídica existente. Esses atos passam a vigorar imediatamente após a promulgação.

Aléxia Oliveira