Em meados de 2021, foi sancionada a Lei n.º 14.195, que originariamente objetivou a facilitação na abertura de empresas e outros temas do ambiente corporativo e de negócios, mas que também tratou de temas de direito processual civil e implementou mudanças significativas, principalmente em relação ao processo de execução.
A lei cuidou de alterar o art. 921, do Código de Processo Civil (CPC) — que dispõe a respeito do instituto da prescrição intercorrente. Este instituto consiste na perda da pretensão (perda da exigibilidade do direito) de executar, em razão da inércia demasiada pelo credor, para viabilizar o efetivo cumprimento da obrigação estabelecida no título judicial ou extrajudicial executado.
Neste texto, abordaremos as principais alterações relacionadas à prescrição intercorrente, notadamente a respeito da(s) mudança(s) sobre: (i) o termo inicial da sua ocorrência; (ii) as causas de interrupção; (iii) a sucumbência processual, caso ocorra o reconhecimento dos seus efeitos; e (iv) a aplicação da alteração normativa em relação aos processos em curso.
Prescrição intercorrente: principal alteração
Sem dúvidas, a alteração mais impactante da lei consistiu na modificação em relação ao novo termo inicial de contagem do prazo de prescrição intercorrente.
Antes, caso não fossem localizados bens do devedor, o processo de execução era suspenso por um ano, sendo que apenas no caso de não haver manifestação do credor durante esse período é que se iniciava a contagem do prazo da prescrição intercorrente, com a ordem para o arquivamento do processo.
A alteração legislativa prevê que, caso não sejam localizados bens do devedor ou este não seja encontrado, o processo será suspenso. O termo inicial do prazo de prescrição intercorrente do credor, passará a fluir a partir da simples ciência da primeira tentativa infrutífera de citação/ intimação do devedor ou da primeira tentativa infrutífera de localização de bens penhoráveis.
Impacto da alteração na perspectiva do credor
Sob a ótica do credor, a alteração no instituto da prescrição intercorrente trouxe uma mudança importantíssima, com impacto negativo nos direitos dos credores, sobretudo nos processos de execução que já se encontravam em andamento à época da referida alteração.
Outro ponto que merece destaque na alteração, se dá no caso de ocorrência da citação/intimação do devedor, ou da penhora de bens do devedor, que terão o condão de interromper a prescrição intercorrente.
Com isso, uma vez ocorrida a interrupção da prescrição intercorrente pelos motivos acima mencionados, o prazo poderá a começar a contar do zero a partir de eventual futura inércia do credor.
Alteração na condenação em honorários quando houver declaração de prescrição intercorrente.
Outra mudança legislativa significa na nova lei, reflete justamente o entendimento jurisprudencial há muito tempo pacificado, a respeito de que não caberia condenação em honorários quando declarada a prescrição intercorrente, mesmo quando o devedor apresente Exceção de Pré-Executividade.
É que, agora, a alteração é categórica ao absorver o entendimento já pacificado e definir que, caso reconhecida a prescrição no curso do processo com a sua consequente extinção, não haverá ônus para nenhuma das partes.
Conforme mencionado, a nova disposição reflete o entendimento jurisprudencial de que a prescrição intercorrente por ausência de localização de bens não retira o princípio da causalidade em desfavor do devedor, nem atrai a sucumbência para o credor.
Aplicação da alteração normativa em processos em andamento
Outra questão que acarreta dúvidas, diz respeito à aplicação das novas disposições legais aos processos já em curso. Até porque, com alteração legislativa, o temo inicial da prescrição intercorrente passou a ser a simples ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis.
Em contrapartida, surgiu a dúvida sobre a aplicação da alteração (dispositivo legal) aos processos em curso, que em que já pode ter se operado o decurso do prazo prescricional antes mesmo da data de promulgação da nova lei.
A nova lei tem determinação expressa para produzir efeitos imediatos na data de sua publicação (art. 58, V), o que causa dúvidas em relação aos processos já ajuizados.
Isso se deve à impossibilidade de a norma processual retroagir e ser aplicada imediatamente aos processos em curso, para resguardar os atos processuais praticados sob a vigência das antigas disposições (art. 14, do CPC).
A questão somente veio a ser pacificada no Incidente de Assunção de Competência (IAC) número 01, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. O julgamento foi o primeiro IAC instaurado e julgado no STJ, justamente para resolver os impasses a respeito da prescrição intercorrente.
Após a discussão a respeito do julgamento, foi decidido que a alteração legislativa em relação à prescrição intercorrente é aplicável imediatamente aos processos já em curso.
Ou seja, o termo inicial de incidência da prescrição intercorrente é a ciência da primeira tentativa de localização de patrimônio após a suspensão e a única causa de interrupção é a constrição patrimonial.
Conclusão
Fato é que premissa da extinção do processo pelo reconhecimento de prescrição intercorrente mudou. Antes, a premissa era: dissidia do exequente e não localização do patrimônio.
Agora, a premissa é: apenas a não localização do patrimônio, de maneira que requerimentos para dar andamento ao processo ou tentar localizar patrimônio não mais interrompem o prazo prescricional, que somente pode ser interrompido pela constrição patrimonial.
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